Feche portas e janelas. Coloque o gato para dentro. O Kindle vem aí, e com força total. Saiu na Veja. Foi até capa da Época. E, em breve, estará na sua casa. Talvez seu filho já esteja usando um Kindle escondido e você nem saiba.
As editoras estão alvoroçadas. Também, não é para menos: o livro “O símbolo perdido”, de Dan Brown, teria vendido mais versões no formato digital do que no impresso. Especialistas dizem que é o começo do fim dos livros tal qual os conhecemos. Será que realmente há motivo para tanto alarde?
Difícil dizer, mas este blogueiro acha que não. Passado o hype, o mais provável é que tudo volte à normalidade e o Kindle seja apenas mais um formato disponível para os fãs de uma boa leitura. Talvez haja um boom nas vendas de livros eletrônicos tal qual ocorreu com o advento dos CDs nos anos 80 e 90: muitas pessoas correram para atualizar suas coleções de vinis, dando a impressão de que os lucros astronômicos eram para sempre e que o caminho da digitalização era irreversível. O que se viu foi o contrário: demorou, mas as vendas de CDs se estabilizaram e passaram a cair, e o vinil passou de item cult para melhor opção para aqueles que realmente curtem música.
A analogia é óbvia: da mesma forma que um fã de jazz não se contenta em ouvir John Coltrane em um arquivo de 128 kbps, da mesma forma que um fã de cinema não aceita assistir a “Crepúsculo dos Deuses” na tela do computador, é possível que um fã de James Joyce considere que a experiência de ler “Ulisses” numa telinha de cristal líquido não seja algo lá muito transcendental. “E o que explica o sucesso do livro de ‘O símbolo perdido’?”, perguntará o astuto leitor. Bom, pra mim sempre ficou claro que um fã de Dan Brown é capaz de se contentar com pouca coisa.
Isso porque o livro físico possui um fator “fetiche” que não pode ser desprezado. Eu sei, dizer isso já virou clichê, mas é verdade. Ao menos para mim é. Gosto do cheiro da folha dos livros. Tenho prazer em passear em livrarias, olhar capas. Às vezes me surpreendo admirando meus próprios exemplares.
Mas a idéia de ter um Kindle não me desagrada nem um pouco: já estou cansado de ser extorquido financeiramente pelas importadoras. Talvez, com um Kindle, possa finalmente realizar meu sonho de consumo e assinar a “The New Yorker” sem ter que pagar R$ 42 pela edição (nos EUA, cada exemplar sai por menos de um dólar). Além disso, em tempos de correção política, um Kindle possui um apelo inegavelmente ecológico: um livro de papel pode consumir uma árvore inteira, ou mais. Um livro digital consome apenas a matéria-prima com a qual é fabricado, e olhe lá.
Mas talvez a grande vantagem do livro eletrônico seja esta: ninguém vai ser cara de pau o bastante para pedir seu Kindle emprestado. Então dê adeus àquele seu amigo folgado que nunca devolve seus livros e que acredita que a orelha serve para marcar a página onde se parou a leitura. Por outro lado, esqueça também a idéia de levar aquela gatinha para ir até sua casa conhecer a sua biblioteca. A não ser que você se dê por feliz em expor sua coleção na tela do Kindle, com “Coltrane for lovers” tocando no último volume em seu iPod.
quarta-feira, 14 de outubro de 2009
Kindle: nunca vi nem comi, eu só ouço falar
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